silence | 23
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Pertenceu-me. Foi minha desde o dia em que respirei pela primeira vez. Disse-lhe um até já que não pude evitar mas na certeza de que a separação era temporária, um dia o berço seria de novo o meu lar. Durante anos carreguei o peso da saudade e do vazio de cada vez que a deixava para trás, porque a vida me obrigava a olhar noutra direcção. Fui adiando o regresso. Mas voltar estava sempre mais perto, julgava eu.
Até que me pediste para arrumar a minha vida e partir, finalmente! E arrumei os sentimentos, apetrechei-me de certezas e fiz as malas. Estendeste-me a mão e, num acto de confiança, esperaste que eu a agarrasse e desse o salto sem olhar para trás... Mas cedi ao hábito e olhei. Olhei e, de novo, prendi-me ao que sabia que não queria mas que me escudava na familiaridade que eu achava que precisava. E deixei-te só com a cidade que julgava mais minha do que tua mas pela qual não fui capaz de lutar. Nunca soube o que seria ser feliz contigo e com o Tejo como papel de fundo. Perdi-a e perdi-te para ela.
Sonhei muito. Desejei mais ainda. Prometi demasiado. E continuamos à espera - ela para me receber e eu para me lançar aos seus braços. As minhas escolhas distanciaram-me da minha vontade e vivo inquieta neste eterno limbo, entre o que devo e o que quero, o seguro e o incerto, o bom e a possibilidade do melhor.
A menina dos meus olhos. A moça que, não sendo de ninguém, é de toda a gente que nela, um dia, tocou. A cidade onde a saudade se canta e se semeia nos corações de quem anseia sempre lá voltar. O meu berço, a minha infância, o meu eterno "se...". A casa que nunca se há de cansar de esperar por mim de braços abertos. Porque sabe que, um dia, esse abraço vai chegar.